domingo, 13 de agosto de 2006

Cabelo de Algodão

Hoje faz exatamente um ano que meu avô faleceu. E eu não consegui me acostumar com essa ausência até agora. Ainda tenho a foto dele na minha mesa (Com um casaco de lã mesmo que no verão, na eterna posição joelhos cruzados, mãos entrelaçando as pernas, olhos fechados, sorriso no rosto.). E ainda procuro o rostinho dele na janela quando visito meus pais.
Ter acompanhado a morte dele de perto me chocou de um jeito, que hoje tenho que me esforçar de verdade para esquecer aquelas horas em que ele foi ficando cego de repente, e desesperado, gritava nossos nomes para ver se todo mundo estava ali ao seu lado.
Eu nunca tinha visto alguém morrer. Já tinha visto outros parentes mortos, mas não...morrendo. É assustador ver uma pessoa em plena consciência de que está morrendo. E que dali, não tem como fugir. Lembro que ele me agarrou com tanta força quando ouviu minha voz mas não conseguia me ver. Ele levou exatamente 40 minutos para ficar cego. E não conseguiu ver a tempo todas as pessoas que chegavam para visita-lo.
Meu vô sempre foi surdo, desde que eu era criança. Mas ouvia muito bem o que queria. E não perdia as conversas por conta disso. Era um famoso contador de histórias da cidade, e era exagerado e dramático, como toda a família. Forte, bebeu até os 95 anos, e nunca ficava doente. Era um avô metrossexual: vaidoso e galanteador. As mocinhas da padaria que o digam.
E para ele, aquele momento ali, sendo o centro das atenções mas involuntariamente, deve ter sido a pior despedida possível. E queria muito poder apagar essa imagem da cabeça.
O Natal já foi uma data que passou em branco. E hoje foi o primeiro Dia dos Pais sem o vozinho por perto. Sem a cervejinha gelada com bastante espuma no copo de requeijão. Depois, sem aquele cd da Orquestra Tabajara fazendo versões de Frank Sinatra que ele tinha que (tentar) ouvir todo santo dia.
Tem gente que diz que só damos valor a essas coisas quando elas nos deixam. Nesse caso não. Porque nós nos agarramos a essa rotina dele com uma força tão grande, que ela ainda é presente demais para ser vista com saudade. Porque não se foi propriamente.
E eu sei que por mais que eu tenha feito o dia do meu pai ter valido a pena hoje, um pedaço dele não estava aqui. E nenhum presente faz mais sentido.

2 comentários:

Unknown disse...

Só hoje, tipo 3 anos depois, percebi que o link do primeiro parágrafo está errado! O correto é este aqui: Foto do meu Avozinho

Kikko disse...

Ahhh que saudade absurda!

=)